

Mundo do Trabalho
A superação do racismo estrutural no Brasil depende intrinsecamente da ampla divulgação e do conhecimento dos dispositivos legais e constitucionais que regem a matéria. Esta é a avaliação de Manuellita Hermes, procuradora federal vinculada à Advocacia-Geral da União (AGU), expressa em entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico. A manifestação ocorreu durante o IV Congresso Nacional e II Internacional da Magistratura do Trabalho, sediado em Foz do Iguaçu (PR) no final de novembro, evento que também marcou o lançamento do Anuário da Justiça do Trabalho 2025.
Segundo a procuradora, é fundamental que a população conheça os instrumentos jurídicos disponíveis contra a discriminação racial. Ela recorda que o arcabouço normativo de combate ao racismo foi robustecido em 2021, quando o Congresso Nacional aprovou, com status de emenda constitucional, a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância. Assinado pelo Brasil em 2013, o tratado internacional foi internalizado conforme o rito previsto no artigo 5º, parágrafo 3º, da Constituição Federal, que exige aprovação por três quintos dos votos em ambas as casas legislativas.
A Convenção oferece definições explícitas para conceitos como discriminação racial, racismo e intolerância, além de detalhar os deveres impostos ao Estado. Entre as obrigações, destacam-se a prevenção, eliminação, proibição e punição de atos discriminatórios, bem como o compromisso de implementar políticas especiais e ações afirmativas para garantir a igualdade de direitos e o efetivo acesso à Justiça.
Hermes lamenta o desconhecimento generalizado sobre a existência e o alcance dessa norma. “Infelizmente as pessoas sequer conhecem a existência da medida constitucional e isso é muito triste. Precisamos compreender que está existindo um apagamento normativo, um apagamento constitucional”, critica a procuradora, referindo-se à baixa aplicabilidade social de um dispositivo de tamanha envergadura.
Adicionalmente, a procuradora federal destaca a importância da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 973, atualmente sob análise do Supremo Tribunal Federal (STF). A ação, proposta por sete partidos políticos, pleiteia o reconhecimento do racismo estrutural como um "estado de coisas inconstitucional" e a consequente adoção de políticas públicas de reparação para a população negra.
Em julgamento recente, o STF reconheceu a existência do racismo estrutural no país e as graves violações a normas e princípios constitucionais que dele decorrem, proferindo uma série de determinações ao Poder Público. Contudo, a Corte rejeitou, por maioria, a declaração formal de um "estado de coisas inconstitucional".